Entro no Templo, olho um Altar branco e pacífico como de costume, mas com um adereço de cor lilás que quer me lembrar algo e mesmo que me esqueça me sinto envolvido pelo momento.
Dois, três, cinco minutos de reza e chega. Vou procurar meus manos e manas para cumprimentar e dividir este sentimento que está cheio em meu peito.
Ansiedade, euforia, sorriso fácil.
Lágrimas que não param de cair, saudade inexplicável, tristeza.
O tempo passa tão rapidamente que, quando menos espero, a movimentação começa para formarmos em duplas. Quero ir ao lado de um amigo, amiga, esposo, namorada, colega de trabalho, de escola. Mas quando o apito soa, lembro que o silêncio é a disciplina de maior valor no programa de hoje.
Só posso olhar.
Olho para o lado, para baixo para não tropeçar no pedregulho, para outro lado para ver o sol surgindo e pintando de laranja, amarelo escuro, amarelo claro e, pronto, esquentou e começo a suar.
Ficou para trás o cemitério São Lázaro, fiz o sinal da cruz e olhei o cruzeiro. Logo estou na primeira parada. Que lugar! Que visual! Ouço preces, esqueço um pouco do momento, tiro o celular do bolso e dá-lhe foto, melhor dizendo, dá-lhe selfies.
Mais selfies.
O apito toca novamente e volto a me calar. Não deu tempo de explicar direito o que estou sentindo, a conversa precisa ser interrompida.
Chego no Pico da Bandeira, olho para o Kadoche com sua espada e começo a descida, ruim para o joelho, mas bom para minha preguiça. Lá embaixo me deparo com uma casa simples, a represa Apóstolo Barnabé:., barulho gostoso da cachoeira e uma Capela.
Coração pintado na fachada. Imagem bela.
Sombra.
Mas num fôlego só subo um íngreme e curto trecho para mais à frente tomar um café com pão na entrada da Fazenda Eclética.
Volto ao assunto interrompido sobre mim, meu momento.
Chá mate.
Café preto.
Pão.
Mais selfies.
Tempo suficiente para me preparar para uma subida um tanto longa e acompanhada do calor. Penso e sinto um pouco a sensação de sacrifício.
No final desta subida vejo nosso destino. Lá no alto, o sol ao fundo me força a cerrar os olhos. Melhor não olhar agora, nem dá para fotografar porque estou em plena caminhada.
Chego ao Sagrado local, em sua parte de baixo conhecida como Casa do Caminho. Ouço o Hino à Fraternidade Universal enquanto as bandeiras sobem e em seguida descanso à sombra das jaqueiras.
Cato uma laranja no pé.
Quero água. Quero banheiro.
Lugar bonito, tranquilo.
Mais selfies.
Olho rapidamente a capela, faço o sinal da Cruz, percebo que há um cruzeiro logo ali, mas não sei se posso fazer uma foto na escadaria, tão branquinha. Deve ser sagrada.
Após o descanso, entro no cortejo novamente para subir o Monte e avisto Irmãos mais velhos lá no cruzeiro. Deve ser sagrado mesmo.
Subo.
Dificuldade, dor, calor, sacrifício.
Cheguei.
Avisto mais uma capela, um pouco maior que as anteriores e nessa posso entrar e descansar ao som do Sermão do Monte. Ali relembro dos diversos pedidos que fiz durante o percurso. Lembro também de todos os agradecimentos às graças que recebi.
Lá na capela, enquanto o Sacerdote celebra o Ofício, me lembro que a caminhada e aquele momento de elevada grandeza espiritual são em homenagem ao nosso Senhor Jesus, o Cristo.
Esqueci de olhar para o alto durante a caminhada, para além das nuvens e dedicar meus passos Àquele que caminhou o trajeto da dor, do desprezo, da violência, do desamor com tanta coragem… para que eu pudesse perceber que apesar de todas as mazelas o amor vence, sempre vence.
Desci o Monte Tábor, almocei em confraternização e segui o caminho de volta, notando que levava tanta coisa no início e retorno cansado, mas com uma leveza que me deixa com algumas indagações: Onde deixei a tristeza que coloquei no meu bornal? Cadê o medo, a desesperança? Ficou pelo caminho ou deixei no Monte?
Engraçado que nem percebi. Deve ter sido por causa das selfies. Olhei tanto para mim que não percebi que havia alguém que foi tirando um peso que eu não queria jogar fora.
Obrigado, meu Mestre, meu Amor, meu Caminho. Até ano que vem, com minhas humanas certezas vazias que se desmancham a cada passo que dou no silêncio ruidoso de minha peregrinação, que não me leva ao Monte Tábor apenas, me leva ao Teu Sagrado Coração.
Silvain:.
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